A história do surgimento da primeira divindade no Egito Antigo remonta ao mito da criação do universo. Para eles todo o universo iniciou-se das Águas Primordiais, Abismo Primordial, ou ainda Oceano Primordial. Estas Águas não possuíam superfície, elas expandiam-se para todos os lados e ainda hoje podem ser encontradas nos limites do conhecido. O cosmo é uma vasta cavidade no meio desse espaço sem limites das Águas Primordiais. As águas que encontramos hoje fazem parte desta Águas e, o céu nada mais é um divisor entre as águas superiores e as inferiores (Clark, s/d). Podemos ver nisso um arquétipo do útero? Creio que sim!
Nessa época, quando apenas existia o Oceano Primordial, não existia Luz e por isso tudo era Trevas, elas cobriam a face do abismo. O universo foi criado a partir de uma retração parcial da noite eterna onde o domínio foi concedido ao Deus-Sol (Clark, s/d).
É importante ressaltar a dualidade deste mito: a água não possuí forma e nem características positivas. E a forma é gerada neste meio aquoso. Ou seja, não era o nada que existia, pois a água não é o nada, ela apenas não tem forma e por isso pode ser moldada em qualquer tipo de coisa (Clark, s/d). Salientando que a importância deste simbolismo é proveniente da própria subsistência daquele povo: o rio Nilo.
Quando os aguaceiros do inverno trazem a nova vida, o Nilo sobe e encharque todas as terras envolta do seu corpo. Este é o início de um novo ciclo de crescimento e essas águas são "águas de vida" e o Oceano Primordial ao qual elas pertencem é o Deus Nun, o Pai dos Deuses (Clark, s/d).
Para os antigos egípcios, emergir dessas águas possui quatro significados: a chegada da luz, da vida, da terra e da consciência (Clark, s/d).
É importante entender que eles não davam bastante importância ao mito, por isso vários mitos de criação existem, mas não porque não era importante saber como o universo foi criado, mas porque era muito misterioso e complexo entender como havia se dado o processo da criação (Clark, s/d). E por isso é tão complicado para nós entender de qual Deus, eles estão falando.
Sendo assim o Oceano Primordial, vocês perceberão, foi chamado de várias formas, como Nun e Atum ou até mesmo Rá. Mas o que é importante é que todos eles vieram destas águas (Clark, s/d), iniciam-se com a Luz e a chegada da Terra e a tomada de consciência que produz o controle.
Das trevas primordiais surgiu a primeira aurora e foi quando o Sol, retratado pelo Menino Divino com o dedo na boca, surgiu. Chu, o sopro desta divindade foi aquele que separou a terra do céu, as águas inferiores das superiores e criou o espaço para que a Luz emergisse (Clark, s/d).
Com a Luz, surge a vida, o movimento espontâneo para cima, a evolução. O simbolismo deste fato é o mesmo do sol surgindo, mas neste caso retratado com a serpente se erguendo em cima de sua cauda, ou a flor brotando das águas, abrindo suas pétalas e revelando a luz (Clark, s/d). Ou seja, a sabedoria.
Como a sabedoria necessita de um corpo para se manifestar, ocorre o surgimento da Terra, ou a Colina Primordial, Primeiro Lugar, ou Primeiro Trono e com ela as primeiras ordens e direções (Clark, s/d).
Mas para lidar com toda a força que a energia da Luz e sua sabedoria dão a este ser nesse involucro chamado corpo é preciso ter uma consciência, que exerça controle sobre a mente, a vontade e o Eu, para que possa dar forma a todos os pensamentos que surgirem daí por diante e assim, nasce o "Verbo", aquele que molda as águas primordiais. E assim, o restante dos fenômenos conhecidos são derivados das abstrações semipersonificadas deste "Verbo", como "Comando", "Vontade" e "Compreensão" (Clark, s/d).
Tudo isso se organiza e se completa num todo conhecido como Deus Supremo, pois é completo em si só: Atum, "O Completo", ou Rá, enquanto Deus Supremo representado pela Luz (Clark, s/d):
"Ó Atum! Quando vieste a ser, surgiste como uma Grande Colina, Brilhaste como a Pedra Benben no Templo da Fênix, em Heliópolis" (Texto 600 das Pirâmides, in Clark, s/d, p.31)
Esta oração, Texto 600 das Pirâmides, demonstra isso do qual vinhamos falando: Atum antes de ser, não era e por não ser simboliza a água primordial que não possuí forma; ao atravessar o não ser e vir a ser torna-se Terra, a Colina Primordial, e estabelece a ordem e as direções, assim como traz a Luz e a consciência do construir através da modelagem das águas primordiais.
Atum é portanto própria Colina Primordial, Texto 587:
"Louvo a ti, ó Atum!
Louvo a ti, ó Devir, e que vieste a ser enquanto tu mesmo!
Te ergueste sob teu nome de Grande Colina.
Vieste a ser sob teu nome de Devir"
(Texto 587 das Pirâmides, in Clark, s/d, p.32)
E, também é, o próprio Oceano Primordial!
Conseguiram acompanhar?
O ciclo se repete com todos nós em cada alma que nasce deste Oceano Primordial.
A Luz divina necessita estar em movimento para se manisfestar, Ela manifesta-se ao encontrar o movimento, a Vida e desabrocha pela sabedoria trazendo Luz onde não existia, mas toda essa manifestação necessita de algo que a contorne que lhe dê uma forma e onde possa existir, por isso a Colina Primordial é parte de si, um corpo que lhe confere forma e poder, mas tanto poder necessita ser controlado e por isso a Palavra, o Verbo, é o veículo pelo qual este poder, esta Luz manifesta-se e constrói.
Continuaremos na semana que vem! Boa semana a todos!
Referência Bibliográfica:
Clark, R. T. R.;Símbolos e Mitos do Antigo Egito: Deuses, mitos e cultos: Osíris, Néftis, Órus, Ísis, Seth. Apopis. Editora Hemus. p. 29 a 32.
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