
Deus principal de Tebas (Waset), cidade do Alto Egito sede do governo durante o Novo Império (cerca de 1550-1070 a.C.), Àmon  tornou-se um dos mais poderosos deuses da Antiguidade.
Sua proeminência na região já é notada no Médio Império (cerca de  2040-1640 a.C.), quando, por razões que ignoramos, os príncipes da XI Dinastia,  o adotaram como deus da sua residência.
Instalado em Tebas, ao lado do antigo deus local Montu, foi logo  assimilado a Min, deus da fecundidade.
Foi, entretanto, nos cinco séculos do Novo Império que Àmon se  tornou o líder do panteão egípcio.
Àmon não tinha mitologia própria. Criaram-lhe, então, uma  família: Mut (uma deusa mãe) tornou-se sua esposa e Kensu (o deus da lua) seu  filho.
 Àmon foi associado ao deus criador solar Rá (de Heliópolis) daí o  nome Àmon-Rá; e posteriormente o assimilaram à outro deus criador, Ptah (Mênfis).   Tantas associações devem ter causado muita confusão, mas Àmon-Rá tornou-se uma  síntese de todos os deuses criadores, sendo chamado de "Àmon-Rá, Rei dos  Deuses".
Ele era o chefe indiscutido do panteão e deus do Império.   Seu nome quer dizer "O Oculto", e seu mistério está contido em seu nome, pois  sua essência é imperceptível, e ele não pode ser chamado por qualquer termo que  dê idéia de sua natureza íntima, e subjacente de "ocultação".  Sua  identidade é tão secreta que nenhum outro deus conhece seu nome verdadeiro.   Tebas, sua cidade sagrada era o Olho de Rá, e vigiava todas as outras cidades.   Àmon-Rá criara-se a si próprio, era invisível, nascido secretamente.  Todos  deuses tomaram forma depois de ele ter realizado o primeiro ato de criação.
 
Originalmente, Àmon fazia parte de uma das forças elementares da  criação.
No mito da criação que vem da cidade de Mermópolis, Àmon e mais  três deuses aparecem com suas esposas (contrapartes femininas) sobre o montículo  que emerge das águas primordiais.  Parte deste mito foi assimilado pelos  sacerdotes de Àmon-Rá, que associaram Tebas com montículo que emergiu do oceano  primeiro. Àmon-Rá era o criador de homens, deuses e tudo o que existe sobre a  terra.
  
Era ele quem fazia o Nilo transbordar na época das cheias.   Um pouco da água da inundação era recolhida em um vaso cuja tampa era esculpida  na forma de uma cabeça de carneiro (o animal sagrado de Àmon-Rá) e oferecida ao  deus pelo faraó.
Sem dúvida, o Nilo tornava o Egito próspero, mas Àmon-Rá  também era o deus que protegia o faraó (seu filho e representante da terra)  durante as conquistas militares.  A maior parte das riquezas era entregue  ao clero de Àmon-Rá.  Nas paredes dos templos, o faraó é representado  fazendo oferendas a Àmon-Rá e apresentando-lhe as riquezas trazidas das terras  distantes.
Em honra ao deus foram construídos templos tão impressionantes,  que rumores do esplendor de Tebas se espalharam para fora do Egito.
O maior templo dedicado à Àmon-Rá é o Templo de Karnak, chamado  de Ipet-isut pelos antigos egípcios.  Karnak é uma vasta aglomeração de  templos, capelas e outras construções de vários períodos, medindo cerca de 1,5  Km por, pelo menos 0,5 Km.
Ipet-isut era o principal centro de culto da tríade tebana, com  Àmon-Rá à frente, sua esposa Mut, seu filho Kensu, e várias divindades  "convidadas".  Nenhum outro lugar do Egito deixa uma impressão mais  irresistível e duradoura do que Karnak: paredes lindamente decoradas, obeliscos,  colunas imensas, estátuas colossais, estelas...
 Visitando hoje este lugar, dá para se ter uma idéia do que foi o  esplendor deste imenso local sagrado.  Durante séculos este templo foi  reformado e ampliado pelos faraós.  Em Luxor (Ipet-resyt), um outro templo  foi dedicado ao Rei dos Deuses.  Estendendo-se numa área de quase 260  metros, este templo foi construído essencialmente por dois faraós, Amen-Hotep  III (a parte interna) e Ramsés II (a parte externa).  Vários outros reis  contribuíram para as suas inscrições e decorações em relevo, acrescentando  pequenas estruturas ou fazendo alterações, sobretudo Tut-Ankh-Àmon, Hor-em-heb e  Alexandre Magno.  
Em Luxor, Àmon-Rá tomava a forma do deus Min.  Este templo  estava em estreita ligação com o Grande Templo, em Karnak.
Uma vez por ano, durante a estação das cheias, tinha lugar em  Luxor uma grande festa religiosa, a festa de Opet.  A festa tinha início em  Karnak, onde as imagens de Àmon, Mut e Kensu eram colocadas em três barcos  magnificamente decorados com ouro, prata, cobre e pedras preciosas.  Estes  barcos, verdadeiros templos flutuantes, eram rebocados através do Nilo, até o  templo de Luxor, onde as imagens permaneciam por cerca de um mês.
O último episódio da festa era o retorno da frota sagrada.   As imagens eram devidamente colocadas em seus santuários em Karnak, e oferendas  e libações eram feitas pelo próprio faraó.  Os templos, as riquezas  fabulosas que Àmon possuía, o clero poderoso que o servia, clero esse que  desempenhou em inúmeras ocasiões papel importantíssimo, mostram a evidência que  o prestígio e poder cresceram desmesuradamente no espaço de poucos anos.  O  fato de os filhos de sacerdotes herdarem o poder religioso e político dos pais,  assegurou um aumento cada vez maior de seu domínio sobre todo o Egito.
Porém, na XVIII Dinastia, o faraó Akh-en-Àton (1370 a.C.) tentou  mudar esta situação fundando uma nova capital, onde o único deus era adorado,  Àton (o disco solar).  Tebas foi abandonada e os sacerdotes privados de seu  poder, pois os templos foram interditados e o nome de Àmon-Rá, assim como o de  outros deuses, foram apagados dos monumentos.  Esta mudança, porém, não  durou mais do que vinte anos.  Com a morte de Akh-en-Àton tudo voltou ao  que era antes.  Como não poderia deixar de ser, o poder do clero de Àmon-Rá  continuou a crescer.  Esse mesmo excesso de poder causou a decadência de  Àmon-Rá; muitos cultos tinham sido lesados e os sacerdotes de Àmon-Rá,  excessivamente poderosos, não raro representavam uma constante ameaça para os  faraós.  Com o passar do tempo, houve uma contínua ascensão dos cultos que  Àmon-Rá eclipsara.  Durante muito tempo, o poder de Àmon-Rá controlou o  Egito, chegando até os oásis líbios, e à Kush, onde os reis o adotaram como deus  supremo.  
Os sacerdotes tebanos governavam como qualquer outro poder  secular e estabeleciam pequenas rivalidades com o governo dos faraós.
 O resultado final de tudo isto foi que, conquistada pelos  Assírios em 663 a.C., Tebas e o clero caíram como o reino.  Os deuses das  províncias, libertados do jugo econômico de Tebas, retomaram antigos direitos e  privilégios; Osíris, um antigo deus agrícola, aos poucos começou a ocupar o  lugar que fora de Àmon-Rá.  O culto à Àmon-Rá, agora despojado de toda a  sua grandeza, ainda permaneceu até o primeiro século da era cristã.
A trajetória do deus Àmon-Rá mostra como o homem é capaz  de  manipular e extorquir seus semelhantes através da fé.  O que o deus  representava era o conceito mais puro e completo da divindade.  Àmon-Rá  era o "Oculto" que se fazia presente em toda a criação.  Era o "Rei dos  Deuses", que fazia o Egito prosperar e dava vida a todos os seres.
A decadência de seu poderoso clero não abalou sua majestade  divina, pois Àmon-Rá transcendeu todas as falhas humanas.  A concepção de  Deus que ele representava serviu de inspiração às primeiras seitas cristãs, e o  grau de refinamento artístico dos tempos em que foi o deus do império, nunca foi  igualado.
Texto de Wallace Gomes (egiptólogo e artísta plástico)