Andréa Éire
                         Nemeton Tabebuya/Caer  Piratininga
                        O objetivo deste artigo é  relacionar                            e esclarecer algumas afirmações infundadas                            que têm sido difundidas erroneamente sobre os                            celtas e os druidas. Com o crescente interesse  que essa                            cultura vem despertando nos dias de hoje,  vemos inúmeros                            livros sobre neo-paganismo, como também  artigos                            em revistas e sites na internet, citando os  celtas e                            os druidas. Os autores de alguns desses livros  e artigos                            certamente não tiveram adequada assessoria ou                            simplesmente buscaram fontes não confiáveis                            sobre do assunto, pois muitas das informações                            são erros sérios sobre os celtas, que                            acabaram por perpetuar idéias absurdas.
                          Alguns mitos modernos que  surgiram                            a respeito dos celtas se devem à publicação                            do livro de fantasia As Brumas de Avalon (de  Marion                            Zimmer Bradley), romance genial e envolvente,  mas que                            poucas verdades traz sobre os celtas, tendo a  autora                            optado por romancear as informações e                            usado de bastante licença poética, o que                            é desejável em um romance de ficção.                            Não serve, no entanto, como base para estudos                            sobre os celtas e sua religião, o druidismo.
                          Todas as informações                            aqui contidas (como em todo o resto deste  site), vale                            lembrar, são fruto de pesquisas em fontes  primárias,                            acadêmicas e arqueológicas. Não                            buscamos informações na literatura esotérica,                            mas na História, e nos registros que os celtas                             nos deixaram através de suas lendas e mitos.                            A seguir, relaciono os principais pontos de  dúvidas                            e erros:
                         Mito 1: Os druidas  não                            eram celtas: dissociar os celtas dos  druidas                            é o mesmo que dissociar os pajés dos índios                            nativos de nossas terras. Ou, grosso modo,  dissociar                            os padres do catolicismo. Os druidas eram a  classe sacerdotal                            da sociedade celta, eram professores, médicos,                             juízes, advinhos e conselheiros dos reis e  rainhas.                            Sabemos que nem todas as tribos celtas  possuíam                            um druida ou seguiam o druidismo como  religião,                            mas certamente as tribos da maioria do mundo  celta –                            me refiro aqui à Gália, Grã-Bretanha                            e Irlanda – tinham um druida como conselheiro,                             médico, juiz e sacerdote e, como religião,                            professavam o druidismo.
                         Hoje em dia, no entanto, os modernos druidas  não                            possuem necessariamente etnia celta, da mesma  forma                            que não é necessário ser hebreu                            para seguir o judaísmo ou cristianismo, e nem                            hindu para seguir o budismo.
                         Mito 2: Os druidas  construíram                            Stonehenge: o famoso megalítico data                            de 2000 ac, portanto, foi construído muito  tempo                            antes dos celtas  chegarem às Ilhas  Britânicas:                            isso só ocorreu por volta de 700 ac. Essa  informação                            é recente em termos históricos, pois até                            antes da datação por caborno 14, atribuía-se                            aos druidas a construção desse círculo                            de pedras. No entanto, não existe a menor  chance                            dele ser um monumento druida, ainda que  podemos deduzir                            que os druidas realizavam cerimônias em  Stonehenge                            ao descobrirem seu alinhamento com o nascer do  sol no                            solstício de inverno. 
                         Mito 3: Alan Kardec  era um                            druida: esse é um equívoco muito                            comum que freqüentemente associa o kardecismo  ao                            druidismo. Não existe, porém, nenhuma                            relação entre essas duas correntes religiosas.                             Ao criar o  espiritismo,  Denizard Hypolyte                            Leon Rivail (nome verdadeiro de Alan Kardec)   decidiu                            adotar o nome Alan Kardec para permanecer no  anonimato,                            uma vez que ele era um conhecido  professor/filósofo.                            Um dos espíritos que estaria passando as  informações                            sobre a doutrina a Denizard, teria lhe  aconselhado a                            usar esse pseudônimo, pois Alan Kardec teria  sido                            uma de suas reencarnações como um sacerdote                            druida, na Gália pré-romana. Portanto,                            Denizard/Alan Kardec nunca foi um druida  moderno, mas                            em uma de suas encarnações poderia ter                            sido um druida clássico.
                          Vale sempre lembrar aqui que  os celtas                            não eram reencarnacionistas como o são                            os kardecistas. Para os celtas, a alma era  imortal e                            podia (ou não) viver muitas vidas. Imperava o                            livre-arbítrio, mas não havia carma,  recompensas                            ou punições como no moderno kardecismo.                            O livre-arbítrio possibilitava à alma                            celta a opção de ir viver no Outro Mundo                            ao lado de seus ancestrais e seus deuses para  sempre,                            ou voltar ao nosso mundo, não para cumprir  alguma                            tarefa, ou pagar algumam dívida, mas para  viver                            algo que ainda não havia sido vivido, para  experimentar,                            conhecer, vivenciar, enfim. Para os celtas,  era a ordem                            natural das coisas e nenhum deus ou deusa  interferia                            nisso. A vontade da alma era o que regia o que  lhe acontecia                            depois da morte. Voltar a habitar um corpo não                             era uma necessidade (e nem uma obrigação                            para evoluir – não havia o conceito de                            evolução espiritual para eles), mas sim,                            uma opção.
                         Mito 4: Os celtas  eram matriarcais                            e cultuavam uma deusa única: esse  também                            é um erro muito comum e muito observado em  livros                            sobre wicca, a religião criada por Gerald  Gardner.                            Gardner, membro a AOD (Ancient Order of  Druids), criou                            a Wicca baseado em informações apresentadas                            a ele por seu amigo Ross Nichols (criador da  OBOD –                            ordem druídica muito ativa até os dias                            de hoje) e também baseado em elementos da  maçonaria,                            bruxaria tradicional e nos trabalhos de  Margareth Murray                            sobre a suposta religião paleolítica que                            dominava toda a europa e tinha como principal  divindade                            uma Deusa-Mãe. Essa mistura toda resultou numa                             religião interessante e atraente para nossos                            dias, mas também gerou muita confusão,                            pois insinua que os celtas adoravam uma  Deusa-Mãe                            (idéia utilizada no romance “As Brumas                            de Avalon”), o que nunca foi verdade.
                          Os celtas eram politeístas,                            isto é, tinham inúmeros deuses e deusas                            em seu panteão, com a peculiaridade de que  nenhum                            deles e nenhuma delas era um deus-pai ou uma  deusa-mãe                            absolutos, como acontece entre os gregos, por  exemplo,                            onde Zeus era o deus dos deuses e Hera a deusa  das deusas.                            Os deuses celtas eram tribais e associados ao  lar, ao                            clã, ao local – a paisagem. Não                            havia uma Deusa-Mãe no panteão de nenhuma                            tribo celta. Aliás, as deusas celtas  desempenhavam                            em sua maioria o papel de guerreiras ou  esposas indomáveis                            e/ou independentes, que não se submetiam aos                            maridos, tinham seus amantes e levavam sua  vida em liberdade.                            A Deusa-Mãe da wicca é a Natureza  personificada,                            no panteão celta nenhuma deusa representava a                            Natureza como um todo, mas aspectos isolados  dela e                            da paisagem a ela atribuída.
                          A sociedade celta não era  matriarcal,                            isso seria absolutamente inviável para uma  sociedade                            guerreira como a deles. Quando muito, podemos  dizer                            que eram matrilineares, isto é, os filhos  recebiam                            o sobrenome da mãe em vez do sobrenome do pai.                             Mas nem todas as tribos adotavam esse  processo.
                         Mito 5: Somente as  mulheres                            celtas exerciam o sacerdócio:  informação                            provavelmente interpretada do romance citado  “As                            Brumas de Avalon”, onde as personagens que  seguem                            a assim chamada Antiga Religião (relacionada                            aos celtas, mas equivocada – a religião                            dos celtas era o druidismo) eram sacerdotisas  da Grande                            Deusa. Embora Marion tenha citado os druidas e  o Merlin                            como sacerdotes da Deusa única, ela dá                            total ênfase às sacerdotisas, o que levou                            alguns a entenderem que o povo celta dava  exclusividade                            de sacerdócio às mulheres. Sabemos, no                            entanto, que a classe sacerdotal dos celtas  era composta                            por druidas e druidesas, embora alguns autores  também                            digam que eram apenas os homens que podiam  exercer essa                            função – autores estes equivocados,                            mas certamente influenciados pelo  mesodruidismo (ver                            texto sobre o tema), que era  machista/patriarcal como                            a sociedade da época em que existiu, séculos                            18 e 19. São todos unânimes, porém,                            em negar que somente as mulheres celtas  exerciam o sacerdócio.                            E nenhum deles, nem druidas, nem druidesas,  eram sacerdotes                            da Grande Deusa. Eles eram sacerdotes de seu  povo.
                         Mito 6: Os druidas  eram monoteístas:                            outro erro absurdo que provavelmente se  origina nos                            equívocos difundidos pelo mesodruidismo. Se  houve                            ou há algum druida monoteísta, certamente                            ele nasceu depois do século 19 e esteve ou  está                            professando a religião de forma equivocada,  influenciado                            pelo poder do cristianismo. Os druidas  clássicos                            pré-cristãos eram politeístas e,                            como todo sacerdote pagão, veneravam os  espíritos                            da Natureza, deuses tribais, deuses da  paisagem e os                            ancestrais. O druidismo moderno, ou  neo-druidismo, é                            igualmente politeísta, pois se baseia nas  crenças                            dos druidas clássicos e não nos druidas                            do renascimento do século 19.
                         Mito 7: Os druidas  vieram da                            Atlântida: não. Mesmo que Atlântica                            existisse, os druidas não teriam vindo de lá.                            Embora na mitologia celta existam inúmeras  lendas                            sobre ilhas míticas, os druidas nunca são                            originários dessas ilhas. Entre essas inúmeras                             ilhas, inclusive, não há nenhuma que tenha                            uma semelhança sequer com Atlântida. As                            ilhas dos mitos celtas são lugares para onde                            os heróis se dirigem sob o encantamento de  algum                            ser mágico ou então em alguma missão                            em busca das terras imortais. Os celtas nunca  vêm                            das ilhas, mas vão para elas. Essas ilhas são                            associadas ao Outro Mundo, à terra da  juventude                            eterna, à terra dos ancestrais, ao local para                            onde as almas vão depois da morte, onde  viverão                            uma vida perfeita e imortal ao lado dos  antepassados                            e dos deuses.
                         O druidismo surgiu quando os  celtas                            chegaram nas ilhas britânicas e lá travaram                            contato com a espiritualidade dos povos  neolíticos                            que habitavam a 
                         região. Essa mistura da  espiritualidade                            celta com a desses povos originou a religião                            dos celtas que conhecemos como druidismo, e  esta migrou                            de volta ao 
                         continente, levando o  druidismo para                            a Gália. Alguns autores chamam a religião                            dos neolíticos de proto-druida, mas a  Atlântida                            está certamente fora de questão. É                            certo que o surgimento do druidismo é uma  mescla                            da espiritualidade celta (de origem  indo-européia)                            com a dos povos do oeste 
                         europeu. Os celtas vieram do  coração                            da europa, onde hoje é a  Hungria, Rep.                            Tcheca, Suíça. Os povos neolíticos                            construtores de  estruturas megalíticas                            do oeste europeu já estavam por lá havia                            algum tempo quando da chegada das primeiras  levas de                            tribos celtas. Do contato entre esses povos  surge o                            druidismo clássico.
- Douglas Phoenix -